segunda-feira, 11 de junho de 2012

Guerra cibernética

Será que deveríamos nos preocupar com a guerra cibernética? A julgar pelas manchetes excessivamente dramáticas da mídia, com certeza. A guerra cibernética torna mais fácil e, portanto, mais provável que uma guerra comece.
Por quê? Primeiro, a guerra cibernética é barata e destrutiva, pode convencer Estados fracos a entrar em conflito com os mais fortes. Segundo, é difícil identificar a origem do ataque, os responsáveis talvez não temam retaliação imediata e, assim se comportar mais agressivamente. Terceiro como é difícil se defender dum ataque cibernético, a maioria dos Estados atacaria primeiro. Por fim, já que as armas da cibernética estão envoltas em sigilo e incerteza, é difícil realizar acordos de controle de armas.
Não é bem assim, diz Adam Liff, da Universidade de Princeton, Que presume que a guerra cibernética tenha uma lógica inerente --uma teleologia-- que sempre resultaria em mais conflito é uma visão míope que deixa de considerar certas sutilezas da estratégia militar e das relações de poder. Precisamos pensar nas armas cibernéticas como implementos utilizados por agentes reais, com objetivos reais e interesses reais, bem como custos reais a pagar caso algo escape ao controle.
Liff não vê motivo aos cenários pessimistas e ao pânico. Ele chega a delinear diversos cenários que a guerra cibernética poderia reduzir --e não intensificar-- os conflitos. Isso mesmo: o advento das armas cibernéticas poderia servir a promoção da paz mundial.
Os países envolvidos em guerra cibernética não têm como estar certos das conseqüências reais de seus ataques. Mesmo agentes como os Estados Unidos podem não ter idéia da probabilidade de sucesso desses ataques; o risco de que causem danos a si mesmos é elevado, e ataques cibernéticos também podem remover do cenário, ativos de outra forma lucrativos, tais como a infra-estrutura bancária do inimigo. Essa incerteza talvez seja a principal ferramenta de dissuasão.
Como aponta Liff, é simplório pensar que agentes racionais prefeririam explorar as vulnerabilidades das defesas cibernéticas uns dos outros e com isso iniciar uma dispendiosa guerra cibernética, se esses agentes forem capazes de encontrar maneiras diferentes e mais baratas de resolver seus conflitos. Quanto a isso, a disponibilidade de armas cibernéticas, não importa qual seja o seu real potencial de destruição, poderia permitir que países fracos obtivessem tratamento mais favorável de seus adversários mais fortes, ao evitarem um conflito.
Como as guerras são uma forma de coerção --e é difícil forçar outros agentes a aceitar exigências sem assumir as responsabilidades pelos danos a eles causados. Sim, ataques cibernéticos são difíceis de rastrear, mas o governo que os empregue na expectativa de forçar outro governo a agir como deseja também teria de assumir a responsabilidade pelos ataques. (O motivo para que a Rússia não tenha assumido a responsabilidade por ataques cibernéticos à Estônia, em 2007, e à Geórgia, em 2008, é que esse ataque foi no geral inconseqüente - um ato de hacktivismo, no primeiro caso, e uma questão secundária diante da guerra cinética, física, no segundo.)
Terroristas se interessar muito pelo anonimato, mas o certo é que, desde o 11 de Setembro, nenhum grupo terrorista teve sucesso causando perturbação séria à infra-estrutura civil ou militar. Para a Al Qaeda, o custo a esse tipo de operação seria elevado demais, e não há garantias de que uma campanha de terrorismo cibernético seja tão espetacular quanto detonar uma bomba numa praça movimentada.
Como aponta Liff, gerações de analistas proclamaram com rapidez que o bombardeio estratégico ou a bomba atômica eram "armas absolutas", destinadas a revolucionar a estratégia militar. É inegável que o poderio aéreo e a bomba atônica tiveram impacto profundo nos conflitos militares; mas sua lógica inerente (por exemplo, a idéia de que a guerra aérea admite apenas ataque, e não defesa) foi fortemente atenuada pelas restrições e considerações políticas, sociais e econômicas que afetam os agentes dotados dessa capacidade. Poderio aéreo nem sempre se traduz em poderio político.
A lição útil aqui é que os relatos teleológicos sobre a mudança tecnológica raramente oferecem percepção analítica aguçada e em muitos casos, eles resultam em más decisões políticas. Mas esse raciocínio teleológico sobre a tecnologia ainda é dominante. Da mesma forma que é moda imaginar que a guerra cibernética é ruim a segurança internacional e a paz mundial, está igualmente na moda crer que a mídia social seja ruim aos ditadores, ou que filtros on-line sejam ruins a ação do acaso e o debate público. O mundo real nunca é tão ordenado e claro, evidentemente; ignora essas teorias teleológicas ingênuas e leva a tecnologia a assumir papéis e funções que ninguém esperava que viesse a exercer.
Assim, não importa que lógica inerente tenha as armas cibernéticas, a mídia social ou os filtros on-line, essa lógica inevitavelmente muda quando essas ferramentas se manifestam no regime político, social ou cultural que orienta seu uso prático. É assim que as armas cibernéticas terminam por promover a paz, a mídia social pode reforçar o totalitarismo, e os filtros on-line podem ajudar na descoberta de informação. Nem sempre somos capazes de prever esses efeitos com antecedência, mas, enquanto aderirmos a explicações teleológicas estará reduzindo as chances de desenvolver um enquadramento melhor para a análise tecnológica e o processo decisório.
Tradução de PAULO MIGLIACCI

Nenhum comentário:

Postar um comentário